OnabotulinumtoxinaA (Botox®) no tratamento da enxaqueca crônica: evidências e aplicações

Nos últimos anos, novas opções terapêuticas têm ampliado as possibilidades de tratamento para pessoas que sofrem de enxaqueca crônica, Entre essas alternativas, a OnabotulinumtoxinaA, popularmente conhecida como toxina botulínica, tem se destacado como uma estratégia eficaz na prevenção das crises.

Originalmente desenvolvida para tratar distúrbios neuromusculares e estéticos, a toxina botulínica demonstrou benefícios significativos no controle da enxaqueca crônica, sendo a primeira e única terapia aprovada especificamente para essa condição. Mas como ela funciona? Quais são as evidências científicas que sustentam seu uso? Este artigo explora os principais aspectos desse tratamento, seus mecanismos de ação e sua aplicabilidade clínica.

O que é a enxaqueca crônica e por que a toxina botulínica é uma opção?

A enxaqueca crônica é definida pela ocorrência de dores de cabeça em pelo menos 15 dias por mês, sendo ao menos 8 desses dias com características típicas de enxaqueca, por um período superior a três meses. Essa condição pode impactar severamente a qualidade de vida do paciente, limitando atividades diárias e aumentando a dependência de medicamentos analgésicos, o que pode levar ao agravamento do quadro devido ao uso excessivo de medicação.

A OnabotulinumtoxinaA foi aprovada para o tratamento preventivo da enxaqueca crônica após extensos estudos clínicos que demonstraram sua eficácia na redução da frequência das crises e na melhora da funcionalidade dos pacientes. Seu mecanismo de ação inovador a diferencia de outras abordagens terapêuticas e a torna uma opção viável para aqueles que não respondem bem aos tratamentos tradicionais.

Mecanismo de ação da toxina botulínica na enxaqueca

A toxina botulínica é uma neurotoxina produzida pela bactéria Clostridium botulinum que atua bloqueando a liberação de neurotransmissores, como a acetilcolina, nas junções neuromusculares. No contexto da enxaqueca, seu mecanismo de ação envolve:

✔️ Inibição da liberação de neuropeptídeos pró-inflamatórios, como o peptídeo relacionado ao gene da calcitonina (CGRP), substância P e glutamato, que estão envolvidos na sensibilização da dor.
✔️ Modulação da excitabilidade dos nervos periféricos e centrais, reduzindo a ativação excessiva do sistema trigeminovascular.
✔️ Diminuição da sensibilização central, um fator essencial no desenvolvimento da dor crônica e na transformação da enxaqueca episódica em crônica.

Ao bloquear esses processos, a toxina botulínica não apenas reduz a intensidade da dor, mas também previne a recorrência das crises, proporcionando um alívio sustentado para pacientes com enxaqueca crônica.

A eficácia da onabotulinumtoxina A na enxaqueca crônica foi demonstrada nos estudos PREEMPT (Phase III Research Evaluating Migraine Prophylaxis Therapy), que consistiram em dois ensaios clínicos randomizados controlados por placebo. Os principais achados incluem:

📌 Redução significativa da frequência das crises – Pacientes tratados com toxina botulínica tiveram, em média, 8 a 9 dias a menos de enxaqueca por mês, comparado ao grupo placebo.
📌 Diminuição da necessidade de analgésicos e triptanos, reduzindo o risco de cefaleia por abuso de medicação.
📌 Melhora na qualidade de vida, com impacto positivo na funcionalidade diária e na redução do impacto emocional da enxaqueca crônica.

Esses resultados levaram à aprovação da OnabotulinumtoxinaA pelo FDA (Food and Drug Administration) e pela EMA (European Medicines Agency) como terapia específica para a enxaqueca crônica. No Brasil, alguns planos de saúde já cobrem o procedimento, outros alegam que não faz parte do rol de procedimentos com eficácia reconhecida pela comunidade médica no país.

Como é realizado o tratamento?

O tratamento com onabotulinumtoxinaA segue um protocolo padronizado chamado PROTOCOLO PREEMPT, no qual são aplicadas 31 a 39 injeções em pontos específicos da cabeça e pescoço. O procedimento ocorre da seguinte forma:

✔️ Aplicação em 7 áreas da cabeça e pescoço, incluindo a testa, têmporas, região occipital, cervical e trapézio.
✔️ Doses fixas e distribuídas simetricamente, garantindo um efeito uniforme.
✔️ Sessões repetidas a cada 12 semanas, para manter os efeitos terapêuticos.

Cada sessão dura cerca de 15 a 20 minutos e, por ser um procedimento minimamente invasivo, o paciente pode retornar às suas atividades logo após a aplicação.

A toxina botulínica é considerada segura e bem tolerada, mas, como qualquer tratamento, pode apresentar alguns efeitos adversos, incluindo:

🔹 Dor no local da aplicação, geralmente leve e transitória.
🔹 Fraqueza temporária nos músculos do pescoço, podendo causar uma sensação de rigidez por alguns dias.
🔹 Cefaleia leve após a aplicação, que desaparece espontaneamente.

Efeitos colaterais mais graves são raros e podem ser minimizados pela correta aplicação do protocolo por um profissional experiente.

Recomendações e contra-indicações

A onabotulinumtoxinaA é recomendada para pacientes que:

✔️ Sofrem de enxaqueca crônica, com crises frequentes e debilitantes.
✔️ Não respondem adequadamente a tratamentos preventivos convencionais.
✔️ Apresentam efeitos colaterais intoleráveis com outras medicações.
✔️ Desejam reduzir o uso excessivo de analgésicos e triptanos.

Ela não é indicada para enxaqueca episódica, cefaleias tensionais ou outras formas de dor de cabeça.

Temos, portanto, que a toxina botulínica se consolidou como uma opção eficaz para o manejo da enxaqueca crônica, oferecendo redução da frequência das crises, melhora da qualidade de vida e menor necessidade de medicamentos analgésicos. Seu mecanismo de ação inovador, aliado a um perfil de segurança favorável, torna esse tratamento uma alternativa promissora para pacientes que enfrentam limitações com as terapias tradicionais.

Como qualquer abordagem terapêutica, a decisão pelo uso da toxina botulínica deve ser feita com orientação médica especializada, considerando o histórico e as necessidades individuais de cada paciente.

Referências

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