
O alívio eficaz da dor é a principal preocupação de quem sofre com enxaqueca. Embora existam muitas opções terapêuticas, a escolha do tratamento sintomático ideal deve ser baseada em evidências científicas, considerando a gravidade das crises, as comorbidades do paciente e a acessibilidade aos medicamentos. Com o avanço das pesquisas, novas diretrizes vêm sendo estabelecidas para otimizar o tratamento agudo, permitindo que os pacientes retomem suas atividades cotidianas com mais rapidez e menos efeitos adversos.
A abordagem sintomática da enxaqueca pode ser dividida em dois grandes grupos: os tratamentos específicos, desenvolvidos para atuar diretamente nos mecanismos da crise, e os tratamentos não específicos, que incluem analgésicos comuns e anti-inflamatórios. O objetivo principal é interromper o processo da enxaqueca o mais cedo possível, evitando a progressão da crise e reduzindo o impacto funcional do episódio.
Classes de medicamentos utilizados no tratamento sintomático
1. Tratamentos específicos: triptanos, ditanos e gepants
Os triptanos são os medicamentos mais amplamente utilizados no tratamento agudo da enxaqueca. Eles atuam como agonistas seletivos dos receptores 5-HT1B e 5-HT1D, promovendo vasoconstrição e inibição da inflamação neurogênica no sistema trigeminovascular. Entre os triptanos mais prescritos estão alguns com diferentes perfis farmacocinéticos:
- Sumatriptano (oral, nasal, subcutâneo)
- Rizatriptano
- Zolmitriptano (oral e nasal)
- Eletriptano
- Almotriptano
- Naratriptano
- Frovatriptano
Estudos indicam que sumatriptano 100 mg proporciona alívio da dor em 70% dos pacientes após duas horas, enquanto rizatriptano 10 mg tem eficácia de 74% no mesmo período. A formulação subcutânea de sumatriptano pode ser a opção mais rápida para alívio imediato
Apesar da eficácia, eles são contraindicados para pacientes com histórico de doenças cardiovasculares, devido ao seu potencial vasoconstritor.
Já os ditanos, como o lasmiditan, representam uma alternativa para pacientes com contraindicação ao uso de triptanos. Diferente dos triptanos, os ditanos não causam vasoconstrição, pois atuam seletivamente no receptor 5-HT1F, reduzindo a ativação trigeminal sem comprometer a circulação sanguínea. Estudos mostram que o lasmiditan é eficaz na redução da dor e dos sintomas associados, como náusea e fotofobia, mas pode causar efeitos colaterais como tontura e sonolência.
Os gepants, como ubrogepant e rimegepant, são antagonistas do receptor do CGRP, uma via fundamental na fisiopatologia da enxaqueca. Ao bloquearem esse receptor, os gepants oferecem um alívio eficaz da crise sem os riscos cardiovasculares dos triptanos, tornando-se uma opção promissora para um grupo mais amplo de pacientes.
2. Tratamentos não específicos: AINEs, analgésicos e combinações
Os anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) continuam sendo uma opção viável para pacientes com enxaqueca leve a moderada. Fármacos como ibuprofeno, naproxeno e diclofenaco inibem a enzima ciclooxigenase (COX), reduzindo a produção de prostaglandinas inflamatórias. Além de aliviarem a dor, os AINEs ajudam a reduzir a sensibilidade da dura-máter e das terminações trigeminais, que desempenham um papel central na crise de enxaqueca.
O paracetamol é frequentemente utilizado como alternativa aos AINEs, especialmente em pacientes que apresentam contraindicações gastrointestinais ou cardiovasculares. Embora seja menos eficaz para crises intensas, pode ser combinado com cafeína e metoclopramida para potencializar seu efeito.
Com relação às combinações de medicamentos, a adição de cafeína a analgésicos tem demonstrado melhorar a absorção e a eficácia do tratamento, acelerando o alívio da dor. Entretanto, o uso frequente de cafeína deve ser monitorado, pois pode contribuir para a cronificação da enxaqueca em alguns pacientes.
3. Neuromodulação: alternativa para pacientes refratários
A neuromodulação tem emergido como uma estratégia complementar para pacientes que não toleram ou não respondem aos medicamentos. Entre as técnicas disponíveis estão:
- Estimulação magnética transcraniana (TMS): Reduz a hiperexcitabilidade cortical e pode ser eficaz na interrupção da aura.
- Estimulação elétrica transcutânea do nervo trigêmeo (e-TNS): Modula a atividade trigeminal, promovendo analgesia.
- Estimulação do nervo vago (nVNS): Dispositivo portátil que reduz a frequência das crises em alguns pacientes.
Estudos indicam que a TMS aplicada no início da crise resultou em alívio significativo da dor em 40 a 45% dos pacientes, comparável a algumas terapias farmacológicas.
Critérios para escolha do tratamento ideal
A escolha do tratamento sintomático ideal deve levar em conta três principais fatores:
- Evidências científicas de eficácia e segurança – Com base em ensaios clínicos e metanálises, os triptanos continuam sendo a primeira linha para crises moderadas a graves, enquanto os AINEs são indicados para crises leves a moderadas. Para pacientes com contraindicações cardiovasculares, os gepants e ditanos são opções promissoras.
- Perfil individual do paciente – Considerar comorbidades, histórico de resposta a tratamentos anteriores e preferências pessoais. Pacientes que sofrem com náusea intensa podem se beneficiar de formulações de rápida absorção, como sumatriptano intranasal ou injeções subcutâneas.
- Acessibilidade e disponibilidade do tratamento – Nem todos os medicamentos estão amplamente disponíveis, e fatores como custo e cobertura por planos de saúde podem influenciar a escolha do tratamento. Além disso, em locais onde os triptanos não são facilmente acessíveis, a combinação de AINEs e metoclopramida pode ser uma alternativa eficaz.
Outro ponto importante é a educação do paciente. O uso inadequado de analgésicos pode levar à cefaleia por uso excessivo de medicamentos (MOH), uma condição que agrava ainda mais a frequência e a intensidade das crises. Por isso, recomenda-se que os tratamentos sintomáticos sejam utilizados no máximo 10 dias por mês, e sempre sob orientação médica.
O tratamento sintomático da enxaqueca baseado em evidências proporciona alívio mais rápido e eficaz para os pacientes, permitindo uma recuperação mais eficiente e a retomada das atividades diárias. Com a introdução de novas opções terapêuticas, como ditanos e gepants, a abordagem tem se tornado cada vez mais personalizada, levando em consideração o perfil clínico de cada paciente.
A combinação de medicamentos específicos e não específicos, aliada a uma estratégia de manejo adequada, pode reduzir significativamente a carga da doença. Além disso, a escolha do tratamento deve ser feita com base em evidências científicas sólidas, garantindo que o paciente tenha acesso às melhores opções disponíveis para o controle das crises.
Com um acompanhamento médico adequado e o uso consciente das terapias disponíveis, os pacientes podem alcançar um controle mais eficaz da enxaqueca, melhorando sua qualidade de vida e reduzindo o impacto da doença no dia a dia.