Se você sofre de algum sintoma dos transtornos aqui descritos, você deve procurar um profissional de saúde para lhe auxiliar no tratamento.

A enxaqueca é uma condição neurológica que muitas vezes não acontece sozinha. Estudos demonstram que diversas comorbidades psiquiátricas estão fortemente associadas à enxaqueca, afetando tanto a sua frequência quanto a intensidade das crises. Entre as principais comorbidades psiquiátricas relacionadas à enxaqueca estão a depressão, os transtornos de ansiedade, o transtorno bipolar e o transtorno obsessivo-compulsivo (TOC). Compreender essas conexões é essencial para um tratamento mais eficaz e para melhorar a qualidade de vida dos pacientes.
A relação entre enxaqueca e transtornos psiquiátricos
A associação entre enxaqueca e distúrbios psiquiátricos é bem documentada, com estudos demonstrando que pacientes com enxaqueca têm um risco significativamente maior de desenvolver transtornos do humor e ansiedade em comparação à população geral. Entre os principais fatores que explicam essa interconexão estão:
- Disfunção serotoninérgica – Tanto a enxaqueca quanto os transtornos psiquiátricos envolvem alterações nos níveis de serotonina, um neurotransmissor essencial na regulação da dor e do humor.
- Carga alostática – O estresse crônico e a incapacidade do organismo de se adaptar adequadamente a ele podem contribuir tanto para a enxaqueca quanto para transtornos psiquiátricos.
- Hipervigilância da dor – Pessoas com ansiedade ou depressão tendem a apresentar uma percepção aumentada da dor, o que pode intensificar as crises de enxaqueca.
- Privação de sono – Distúrbios do sono são comuns em indivíduos com enxaqueca e podem agravar tanto a dor quanto os sintomas psiquiátricos.
A seguir, apresentamos as principais comorbidades psiquiátricas da enxaqueca.
Depressão maior e enxaqueca: uma conexão bidirecional
A depressão maior, também conhecida como Transtorno Depressivo Maior (TDM), é um transtorno psiquiátrico caracterizado por sentimentos persistentes de tristeza, perda de interesse em atividades diárias e alterações significativas no sono e apetite. Essa condição pode afetar profundamente a qualidade de vida e está fortemente associada à enxaqueca.
A depressão maior é uma das comorbidades mais comuns da enxaqueca. Estudos apontam que pessoas com enxaqueca têm um risco duas a 2,5 vezes maior de desenvolver depressão em comparação à população geral. Essa relação é bidirecional, o que significa que pacientes deprimidos também têm uma maior probabilidade de desenvolver enxaqueca.
Fatores como alterações nos níveis de serotonina, inflamação crônica e disfunções no eixo hipotálamo-hipófise-adrenal são apontados como possíveis explicações para essa conexão. Além disso, a presença de depressão pode aumentar a percepção da dor, dificultando ainda mais o manejo das crises de enxaqueca. Indivíduos com ambas as condições frequentemente apresentam uma maior resistência a tratamentos convencionais, exigindo abordagens personalizadas que combinem medicamentos antidepressivos, mudanças no estilo de vida e terapias cognitivas.
Transtornos de ansiedade
Os transtornos de ansiedade englobam uma série de condições caracterizadas por preocupação excessiva, medo irracional e sintomas físicos como tensão muscular e taquicardia. Esses transtornos podem amplificar os efeitos da enxaqueca e aumentar sua frequência.
Os transtornos de ansiedade também são altamente prevalentes entre pacientes com enxaqueca. Estudos sugerem que aproximadamente 50% das pessoas com enxaqueca apresentarão algum tipo de transtorno de ansiedade ao longo da vida.
A ansiedade pode atuar como um gatilho para crises de enxaqueca, aumentando sua frequência e severidade. Além disso, pessoas ansiosas tendem a evitar situações potencialmente estressantes, o que pode levar a um isolamento social e impacto negativo na qualidade de vida. Entre os transtornos de ansiedade mais comuns em pacientes com enxaqueca estão o transtorno de ansiedade generalizada (TAG) e o transtorno do pânico.
Pacientes com transtorno do pânico relatam crises de enxaqueca mais intensas e de início abrupto. Uma hipótese neurobiológica sugere que tanto a enxaqueca quanto os transtornos de ansiedade compartilham disfunções no sistema serotoninérgico, justificando essa correlação. Além disso, pesquisas indicam que técnicas de relaxamento, como meditação e mindfulness, podem ser eficazes no controle dos sintomas de ambos os transtornos, proporcionando uma melhora na qualidade de vida.
Transtorno bipolar
O transtorno bipolar é uma condição psiquiátrica caracterizada por oscilações extremas de humor, alternando entre episódios de depressão, eutimia (equilíbrio) e mania. Essa variação emocional intensa pode estar ligada à predisposição para crises de enxaqueca.
O transtorno bipolar também apresenta uma forte associação com a enxaqueca, especialmente a enxaqueca com aura. Fatores genéticos e neuroquímicos compartilhados podem explicar essa relação.
Estudos indicam que alterações no ritmo circadiano e disfunções na neurotransmissão dopaminérgica podem ser fatores que conectam as duas condições. Curiosamente, alguns estabilizadores de humor utilizados no tratamento do transtorno bipolar, como o valproato e o lítio, também podem influenciar na redução da frequência das crises de enxaqueca, o que sugere um possível caminho terapêutico combinado. No entanto, é fundamental monitorar o impacto desses medicamentos, uma vez que alguns podem ter efeitos colaterais que afetam o padrão de dor de cabeça e humor.
Transtorno obsessivo-compulsivo (TOC)
O Transtorno Obsessivo-Compulsivo é um transtorno mental caracterizado pela presença de obsessões e compulsões. As obsessões são pensamentos, imagens ou impulsos recorrentes e intrusivos que causam grande ansiedade ou desconforto. Já as compulsões são comportamentos repetitivos ou atos mentais que a pessoa sente necessidade de realizar para reduzir a ansiedade causada pelas obsessões.
Por exemplo, uma pessoa com TOC pode ter obsessões sobre contagem ou sobre sujeira e, para aliviar essa ansiedade, sente a necessidade de realizar comportamentos como lavar as mãos repetidamente ou verificar várias vezes se a porta está trancada.
A relação entre TOC e enxaqueca pode estar associada a mecanismos neuroquímicos compartilhados.
O transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) é mais comum em pacientes com enxaqueca crônica do que em pessoas com enxaqueca episódica.
A relação entre as duas condições pode estar ligada a disfunções na serotonina e no circuito córtico-estriado-tálamo-cortical. O TOC pode dificultar a adesão ao tratamento da enxaqueca, uma vez que pacientes obsessivos podem ter dificuldades em seguir as recomendações médicas de forma adequada. Além disso, estudos sugerem que pacientes com ambas as condições podem apresentar um maior nível de incapacidade funcional devido à sobreposição dos sintomas, sendo necessário um acompanhamento rigoroso para garantir a adesão ao tratamento e minimizar impactos na rotina diária.
Transtorno de estresse pós-traumático (TEPT)
O transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) surge após a vivência de eventos traumáticos e é caracterizado por flashbacks, hipervigilância e ansiedade intensa. Essa condição pode aumentar significativamente o risco de enxaqueca crônica.
O transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) é uma condição psiquiátrica grave que afeta a regulação emocional e a resposta ao estresse. Pacientes com TEPT têm um risco significativamente maior de desenvolver enxaqueca crônica.
O trauma emocional pode levar a uma hiperatividade do sistema nervoso simpático, desencadeando crises mais frequentes e intensas. Estudos também apontam que essas pessoas apresentam níveis elevados de cortisol e inflamação sistêmica, o que pode agravar ainda mais o quadro de dor. Além disso, pacientes com TEPT frequentemente desenvolvem hipervigilância, o que pode piorar a qualidade do sono e aumentar a suscetibilidade a episódios de dor intensa. Terapias como a terapia cognitivo-comportamental (TCC) e a terapia de exposição são amplamente recomendadas para ajudar no manejo dessas condições simultâneas.
Considerações
A relação entre enxaqueca e comorbidades psiquiátricas é complexa e multifatorial. A identificação e o tratamento adequado dessas condições associadas podem ser decisivos para a melhora da qualidade de vida dos pacientes. O acompanhamento por uma equipe multidisciplinar, composta por neurologistas, psiquiatras e psicólogos, é essencial para um manejo eficaz da enxaqueca e dos transtornos psiquiátricos.
Além disso, estratégias que envolvem educação do paciente, técnicas de gerenciamento do estresse e ajustes no estilo de vida podem complementar os tratamentos médicos, proporcionando um controle mais efetivo das crises e uma maior estabilidade emocional ao longo do tempo.